Embora muitos pacientes apresentem bons resultados com implantes dentários, uma parcela significativa ainda enfrenta complicações, como perda óssea precoce ou até a falha total do implante. Nessas situações, além dos fatores clínicos observáveis, a genética do paciente pode ser a peça-chave que faltava para entender por que o tratamento não teve o desfecho esperado. Realizei uma Revisão de literatura e verifiquei que pesquisas científicas vêm identificando genes específicos que influenciam a intensidade da inflamação, a capacidade de regeneração óssea e a resposta imunológica ao material do implante – elementos decisivos para o sucesso da osseointegração. Com isso, a odontologia caminha para uma abordagem mais personalizada, em que o perfil genético pode ajudar a prever riscos e orientar decisões clínicas mais assertivas.
Genética: um fator silencioso na osseointegração
A integração do implante ao osso (osseointegração) depende de uma série de fatores, como saúde bucal, técnica cirúrgica e cuidados pós-operatórios. No entanto, estudos recentes mostram que variações genéticas individuais também podem influenciar diretamente o sucesso ou fracasso do implante dentário [1]. Essas variações, chamadas de polimorfismos genéticos, podem afetar como o corpo responde à inflamação, como ocorre a regeneração óssea e até a forma como os tecidos ao redor do implante se comportam.
Conteúdos deste Artigo
Como a genética pode alterar a osseointegração de um implante ?
Nos parágrafos a seguir, vou explicar em detalhes quais são essas variações genéticas e como elas influenciam diferentes mecanismos biológicos que podem comprometer a estabilidade dos implantes.
A relação entre genética e os processos que ocorrem ao redor dos implantes dentários se dá pelo fato de que os genes funcionam como “manuais de instrução” para a produção de proteínas no organismo. Quando há variações nesses genes – chamadas de polimorfismos genéticos – a quantidade, a atividade ou a estrutura das proteínas pode ser alterada.
Por exemplo, uma pequena mudança em um gene pode fazer com que o corpo produza metaloproteinases em excesso, degradando os tecidos ao redor do implante. Da mesma forma, alterações genéticas em genes que codificam citocinas inflamatórias podem intensificar ou prolongar a resposta inflamatória, dificultando a cicatrização e comprometendo a fixação do implante.
No caso dos genes relacionados ao metabolismo ósseo, mutações podem afetar a forma como o corpo utiliza nutrientes como o cálcio e a vitamina D, prejudicando a regeneração do osso que sustenta o implante. Ou seja, essas variações genéticas não agem sozinhas, mas modulam reações biológicas fundamentais que, quando desreguladas, aumentam o risco de falhas no tratamento com implantes.
Estas explicações podem ajudar a compreender o motivo de uma perda de um implante inesperado. Esta situação é raramente encontrada mas pode acontecer. Instalamos um implante em um paciente saudável e jovem em uma região teoricamente perfeita e sem contra indicações, e após o período normal de consolidação do mesmo não constatamos a sua cicatrização normal. Em outras palavras ao invés de estar sólido e cicatrizado ele fica mole e solto devendo ser removido imediatamente.

Fatores Genéticos relacionados à osseointegraçAo de implantes
Entre os principais fatores genéticos estudados hoje em dia estão aqueles ligados à produção de:
metaloproteinases da matriz (MMPs), enzimas responsáveis por remodelar os tecidos ao redor do implante de titânio ou de zircônia – o que é essencial para a cicatrização, mas pode ser prejudicial se ocorrer em excesso. Também serão abordadas as
citocinas inflamatórias, como a interleucina-1 e a interleucina-6, que modulam a resposta inflamatória do organismo. Quando geneticamente desreguladas, essas moléculas podem provocar uma inflamação persistente que dificulta a fixação do implante. Outro grupo de genes relevantes está relacionado ao metabolismo ósseo, como os que controlam a ação da
vitamina D – crucial para manter os ossos fortes e capazes de sustentar a prótese. Além disso, discutiremos como fatores genéticos que afetam o sistema imune e grupos específicos da população, como pessoas com
síndrome de Down, também apresentam maior suscetibilidade à falha de implantes. Compreender esses mecanismos é fundamental para que a odontologia avance rumo a tratamentos cada vez mais personalizados e eficazes.
Metaloproteinases: quando a remodelação tecidual sai do controle
As metaloproteinases da matriz (MMPs) são enzimas naturais que ajudam a renovar os tecidos do corpo. Porém, em algumas pessoas, o organismo produz essas enzimas em excesso por causa de certas alterações genéticas, o que pode levar à degradação precoce dos tecidos de suporte ao redor do implante. Estudos apontam que os polimorfismos G-1607GG (MMP-1), C-799T (MMP-8) e -77 A>G (MMP-13) estão ligados a uma maior tendência à perda precoce de implantes [1, 2].
Inflamação exagerada: o papel das citocinas
A inflamação controlada é parte natural da cicatrização. Mas, quando ela é exagerada, pode atrapalhar o processo de osseointegração. Isso é justamente o que ocorre com pessoas que possuem certas alterações nos genes responsáveis pelas citocinas inflamatórias, como a interleucina-1 beta (IL1B) e a interleucina-6 (IL6).
Os genótipos AA do IL1B-511 (rs16944) e GG do IL6-572 (rs1800796) estão associados à perda óssea precoce ao redor de implantes dentários [3]. Outro exemplo é o genótipo 2/2 do polimorfismo IL1RN, que foi mais comum em pacientes com múltiplas falhas de implantes [4].
Esta inflamação exagerada é parecida com o que ocorre nos casos de COVID mais graves. Em alguns pacientes sem nenhuma explicação que não seja uma reação daquela própria pessoa, que pode ser genética, os pulmões eram gravemente afetados de forma desproporcional. Enquanto que outras pessoas não tinham reação alguma.
Metabolismo ósseo e vitamina D
A vitamina D é essencial para a saúde dos ossos, e sua ação depende do funcionamento adequado de seu receptor, o VDR (receptor de vitamina D). Pesquisadores descobriram que o alelo G do polimorfismo rs3782905 nesse gene pode aumentar o risco de perda de implantes, especialmente em pessoas que já perderam mais de um implante [5].
Resposta imune e implantes: a influência da linfotoxina
Outro gene que pode estar envolvido na perda de implantes é o LTA (linfotoxina-alfa). Ele regula parte da resposta imunológica e inflamatória. O alelo C do polimorfismo rs2009658 foi associado a maior risco de falhas, indicando que a forma como o corpo reage ao implante pode ser determinante para o sucesso do procedimento [6].
Síndrome de Down, doença periodontal e predisposição genética
Grupos com características genéticas específicas, como pessoas com síndrome de Down e doença periodontal crônica, também apresentam variações genéticas ligadas à falha de implantes. Entre os genes afetados estão MMP15, MMP17, S100B, GHR, DNAH6 e ZCCHC14, todos relacionados a processos inflamatórios e remodelação óssea [7].
A ciência da genética da perda de implantes ainda está evoluindo
Embora as descobertas sejam promissoras, os pesquisadores destacam que ainda são necessários mais estudos para que esses testes genéticos se tornem ferramentas clínicas confiáveis no diagnóstico e planejamento de tratamentos com implantes [8].
preciso deixar claro que também existe o desenvolvimento de pesquisas no sentido contrário ou seja de determinar fatores que favorecem a cicatrização normal e mais rápida de um implante. Esta é uma frente de pesquisa de alta tecnologia chamada de pesquisa biomolecular e bioquímica.
Um dos exemplos que temos é o implante modelo SLActive da empresa Suíça Straumann. E esse implante foi desenvolvido com uma química específica, uma textura de superfície favorável, e vem em um líquido que favorece sua mobilidade. Como resultados temos um implante que ativamente participar incitando o organismo a cicatrizar mais rapidamente aquele implante quando comparado a outros tipos de implantes mais comuns.
Conclusão: o seu DNA pode influenciar o sucesso do seu implante
A odontologia está cada vez mais próxima da medicina personalizada. Saber que certas variantes genéticas podem aumentar o risco de perda de implantes dentários abre caminho para um futuro onde será possível personalizar o tratamento desde o início. Identificar essas predisposições pode permitir que o dentista tome decisões mais seguras, como usar implantes com maior estabilidade inicial, indicar terapias anti-inflamatórias personalizadas ou reforçar o acompanhamento pós-operatório.
Sobre o Autor : O Dr Roberto Markarian é Mestre e Doutor em Implantodontia, é também Pesquisador com Artigos Publicados internacionalmente, e tem mais de 24 anos de atuação clínica na área. Já realizou mais de 10.000 procedimentos de Implantes Dentários. Hoje coordena a Clínica ImplArt em São Paulo.
Referências
- Genetic Polymorphisms Associated With Early Implant Failure: A Systematic Review
Ferrer N, Aceituno-Antezana O, Astudillo-Rozas W, Valdivia-Gandur I.
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de Araujo Munhoz FB, Branco FP, Souza RLR, Dos Santos MCLG.
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Munhoz Pereira T, Alvim-Pereira F, Kaiser Alvim-Pereira CC, et al.
Clinical Oral Implants Research. 2019;30(12):1165-1178. doi: 10.1111/clr.13529 - Clinical Aspects and Polymorphisms in the LTA, TNFA, LTB Genes and Association With Dental Implant Loss
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Cortés-Eslava D, Gómez-Díaz R, Torres-Lagares D, et al.
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Dereka X, Akcalı A, Trullenque-Eriksson A, Donos N.
Clinical Oral Implants Research. 2022;33(2):131-141. doi: 10.1111/clr.13882
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